Os desafios do e-commerce pós-pandemia

ABRIG: Como acredita que vá funcionar a logística do e-commerce e o varejo no Brasil pós pandemia, quais as perspectivas para o futuro?


JOSÉ CÉSAR DA COSTA: A pandemia acelerou o processo de transformação digital no país e o varejo precisou se adaptar a essa nova realidade. As orientações de isolamento social impostas pela pandemia do novo coronavírus impulsionaram o comércio eletrônico ao redor do mundo. Sem poder sair de casa, as pessoas precisaram mudar seus hábitos de consumo, e as compras pela internet ganharam força como nunca.


A pandemia chamou a atenção para a necessidade de digitalização das empresas, e acelerou a migração de pequenos negócios para o comércio eletrônico. Comerciantes precisaram se digitalizar para acompanhar o consumidor brasileiro. 


O desafio tornou-se ainda maior para as microempresas, que representam mais de 90% das empresas do país. Esse varejista não tem e-commerce, possui pouco conhecimento da área e recursos limitados de investimento. Foi principalmente para esse varejista que voltamos nossos olhares e buscamos oferecer informação para que essa adaptação digital fosse possível. O micro e pequeno varejista se adaptou, foi vender nas redes sociais, por aplicativos, levou o seu atendimento para o WhatsApp e boa parte migrou totalmente para as vendas on-line. Esse comportamento não sofrerá retrocessos, pelo contrário, só tende a ser ainda mais forte.


O consumidor mudou, a jornada de compra deixou de ser linear, ele não está limitado apenas a loja física para adquirir um produto. Agora, ele pode iniciar a compra pesquisando no smartphone, indo em uma loja para experimentar o produto e depois finalizar a compra via computador, no conforto do sofá da sua casa. Tudo isso mostra um novo comportamento de compra e venda entre consumidores e varejistas.


Quanto ao futuro, a “logística 4.0” pode apontar as direções, seu principal objetivo está focado em obter a maior agilidade com o menor custo possível através de monitoramento, segurança e uma cadeia de suprimentos bemorganizada. A pandemia mostrou que aquelas empresas que já utilizavam de sua característica para organizar o trabalho passaram pelo momento de maneira um pouco mais tranquila. Para os pequenos negócios, o investimento em novas tecnologias pode ser mais custoso, como solução, a busca de parcerias para a logística terceirizada poder ser um caminho.


ABRIG: Com a pandemia do Covid-19, quais os maiores desafios para o ramo do e-commerce e varejo?


JOSÉ CÉSAR DA COSTA: O desafio do digital hoje vai muito além de apenas se construir ou buscar uma plataforma de vendas ao consumidor. O desafio é muito maior do que apenas vender. Não basta simplesmente estar no digital, o varejista precisa adequar o seu atendimento, treinar sua equipe de vendas, o consumidor busca uma excelente experiência de compra que passa pelo primeiro atendimento, resposta rápida das dúvidas, forma de pagamento, entrega, política de troca, enfim, uma infinidade de novos processos que precisam estar em pleno funcionamento.


Um dos maiores desafios do varejista on-line é conseguir a visibilidade necessária para ter um bom volume de vendas. Muitos têm aderido ao marketplace, um modelo de negócio que reúne diversos vendedores em uma só plataforma – facilitando o processo de compra do consumidor.


O grande varejista teve que adaptar a sua logística de entrega e o seu estoque. Os supermercados, por exemplo, têm o desafio de fazer uma entrega rápida e manter o seu estoque. Essa mudança de comportamento afeta diretamente a cadeia de suprimentos de uma loja virtual, que precisa atender essa demanda com mais agilidade e eficiência.


Outro exemplo interessante são as lojas de departamento que estão tornando o consumidor mais ativo no processo de compra. Ele pode adquirir um item on-line, mas retirar o produto off-line.


ABRIG: Dentro do ramo, quais os maiores aprendizados que a pandemia trouxe para o Brasil?


JOSÉ CÉSAR DA COSTA: O varejo como um todo foi obrigado a se ressignificar. A questão não é apenas inovar, é preciso se aproximar do cliente. O consumidor quer uma boa experiência de compra, ele quer usar marcas que estejam atentas à questão social e ambiental. A questão do propósito da empresa tornou-se um grande desafio. E isso passa pelo produto, pelo atendimento, pelo treinamento dos funcionários, pelo tipo de sacola que a loja utiliza, são todos os detalhes envolvidos, não é somente o produto em si.


O consumidor faz pesquisa de preços pela internet e também busca a reputação da loja. Por isso, o lojista precisa estar sempre atento a todos os processos que envolvem o consumidor, a marca e o produto.


Na pandemia, ficou muito claro, também, a necessidade de atuarmos em conjunto, o associativismo mostrou-se ainda mais necessário. Em todas as esferas, a busca pelo crescimento conjunto cresceu e tornou-se fundamental. Quem tentar nadar sozinho, infelizmente, não conseguirá enfrentar os desafios que vêm pela frente. Em momentos desafiadores e de crise como vivemos, temos que nos aproximar para buscar soluções comuns e encontrar novos caminhos. O associativismo é a voz unificada de um setor capaz de alcançar soluções efetivas.


ABRIG: Qual a postura que o empreendedor deve ter, durante o período de pandemia, em relação a créditos, funcionários e estoque?


JOSÉ CÉSAR DA COSTA: O momento atual exige dos empresários um alto nível de controle sobre as suas finanças. As consequências decorrentes da pandemia trouxeram grandes desafios aos negócios: redução de clientes, queda no faturamento, manutenção dos funcionários, adaptação sanitária, redução de produção, dentre outros.


O governo federal e algumas instituições financeiras liberaram créditos especiais para os empresários durante a pandemia e essa tem sido uma pauta constante da UNECS e da CNDL. O crédito tem que ser vantajoso, com taxas mais baixas do que as operadas normalmente, com garantias do governo e que atendam aos microempresários, que são os mais impactados. Mas, o empreendedor precisa avaliar primeiro seu fluxo de caixa e entender se realmente vale a pena tomar o empréstimo. Se as contas não estiverem organizadas ou se não valer a pena por uma questão de benefício fiscal, não vale a pena aderir. Empresas mais endividadas são empresas com um risco maior.


O estoque é um grande desafio, uma vez que com o aumento das vendas on-line e a necessidade de oferecer uma entrega rápida, o empresário precisa manter um equilíbrio entre o investimento e a manutenção desse estoque. Existe um indicador que se chama giro do estoque. A avaliação desse indicador é importante uma vez que existe um custo para manter o estoque, ele perde valor com o tempo. O caminho é utilizar a tecnologia para controle e encontrar maneiras de fazer os produtos ficarem o menor tempo possível no estoque.


No caso dos funcionários, é importante analisar as receitas e despesas de todo o ciclo da empresa. Eventualmente, pode ser necessário fazer cortes e deve-se fazê-los antes de uma ruptura completa de caixa. A legislação trabalhista brasileira não abre muita margem a negociação e o pagamento de funcionário é sagrado. Atalhos não valem a pena, especialmente, quando o assunto é funcionário. Deixar de pagar impostos, reflexos do salário ou cometer atrasos, além de não resolver, podem piorar a situação.


Todos os aspectos começam pela organização financeira. Em uma situação de crise, onde existe pouca previsibilidade da situação futura é melhor tomar decisões de curto prazo, o varejista deve avaliar o desempenho financeiro da empresa, buscar a renegociação de dívidas, reduzir custos, revisar atentamente o orçamento da empresa, buscar incentivos e políticas de créditos oferecidos pelo governo, avaliar regimes de tributação, benefícios e créditos fiscais já previstos na legislação, além de acompanhar as novas medidas tributárias publicadas pelo governo.


ABRIG: Com a pandemia, quais as dicas e posicionamentos que as empresas devem ter em relação ao atendimento de clientes agora em modo on-line?


JOSÉ CÉSAR DA COSTA: Primeiramente, ele precisa estar efetivamente no ambiente digital, não basta abrir um site ou anunciar em redes sociais ou vender em marketplaces. O consumidor precisa ser bem atendido em todas as etapas da compra. Isso significa que você precisa prestar atenção especial à experiência do usuário para garantir que os clientes não migrem para o concorrente. O caminho é a conveniência, o consumidor busca comodidade e facilidade. O consumidor está focado na hiperconveniência. O varejista que estiver atento a isso vai crescer.


Outro aspecto importante é buscar unir forças com outros varejistas. Seja em associações, câmaras de dirigentes lojistas, em grupos de lojistas do seu bairro, qualquer forma de buscar soluções conjuntas de crescimento. A troca de experiências e a busca por ações comuns valem muito nessa nova realidade.


ABRIG: Quais os três pontos essenciais e recomendações para os empreendedores diante do cenário de pandemia no Brasil?


JOSÉ CÉSAR DA COSTA: O cenário para o e-commerce nos próximos anos está promissor e, agora, é a hora para se preparar, experimentar e inovar. Entender que não há mais separação entre on-line e off-line, que o poder está nas mãos do consumidor e que a experiência dele é o que impactará diretamente nas vendas do negócio é essencial para conseguir surfar nessa onda de transformações. As lojas tradicionais ainda existirão nos próximos anos, mas terão modelos de negócios muito diferentes, evoluindo para se parecerem mais com showrooms, centros de coleta ou centros de atendimento ao cliente.


Se os grandes varejistas, já adaptados em diversos canais, se viram obrigados a criar novas soluções, os menores, que representam a maior parcela do mercado, precisaram encontrar parceiros já consolidados. Por isso, o associativismo tornou-se ainda mais importante. Busque grupos de varejistas da sua cidade, associações, câmaras de dirigentes lojistas, se associe a outros empresários para a troca de informações, de experiências e para a busca de soluções conjuntas. “A união faz a força”, nuca fez tanto sentido como agora.


Fique atento à novas tecnologias, aos novos meios de pagamentos, instituições bancárias digitais têm oferecido boas condições principalmente aos microempreendedores. O futuro do varejo é tanto próspero como difícil. As empresas inovadoras fazem três coisas para saltar à frente dos rivais: elas constroem redes e parcerias, realizam pesquisa buscando melhores exemplos de modelos de negócio e executam com velocidade e adaptabilidade.



José César da Costa é empresário do ramo de construção civil e materiais de construção há 40 anos com formação em Administração. Foi presidente da FCDL-MG no período de 2007 a 2013. Atuou como vice-presidente do Conselho Deliberativo do SPC Brasil. É presidente da CNDL (Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas) desde 2018. Em 2021 assumiu a presidência da União Nacional de Entidades do Comércio e Serviços (UNECS), formada pelas nove maiores organizações brasileiras do setor.


*Os conteúdos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores. As opiniões neles emitidas não exprimem, necessariamente, o ponto de vista da Abrig.  


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