Democracia e Políticas Públicas se fazem através de uma atividade de RIG cada vez mais profissionalizada

Oenvio da proposta de regulamentação da atividade de Relações Institucionais e Governamentais (RIG) na forma do Projeto de Lei nº 4391/21, ao Congresso pelo governo federal, no Dia Internacional Contra a Corrupção, é um dos passos mais relevantes desde a redemocratização em direção ao amadurecimento da democracia brasileira e a melhoria da qualidade da formulação de políticas públicas. 

Nesse período, o Brasil tem se debruçado sobre reformas econômicas, combatido a pobreza, dado passos largos contra a corrupção e fortalecido suas instituições, avançando na transparência dos poderes. Falta, no entanto, uma ação potente para tornar a democracia mais representativa, jogando luz na relação entre o poder público e os mais diversos grupos de interesse organizados na sociedade.


O debate ético entre o setor público e a iniciativa privada por meio de regras claras é essencial para a formulação de políticas públicas e marcos regulatórios. A regulamentação da atividade de RIG contribui para tornar todo esse processo mais técnico, especializado e, sobretudo, ético e transparente. Isso se deu conforme estabelecido nas 91 competências registradas no Cadastro Brasileiro de Ocupações (CBO) e nas Práticas Recomendadas de RIG elaboradas pela Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig), em parceria com a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).


A importância do comumente chamado lobby para a implementação de políticas públicas eficientes é recomendada, inclusive, pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE. Essa organização define um conjunto de requisitos a todos os países na adoção de “leis de lobby” para que as mesmas sejam ajustadas às condições de cada contexto político e constitucional, visando o aperfeiçoamento dos sistemas políticos e de seus mecanismos destinados à proteção da integridade pública.


Ainda é cedo para garantir que iremos atender a todas as exigências da OCDE com a eventual aprovação da lei, no entanto, a sinalização que o Brasil está dando de que prioriza o assunto e está comprometido com a sua condução é fundamental.


O projeto apresentado pelo Governo representa um avanço muito grande para os profissionais da área, capta muito bem o debate que a Abrig vem promovendo e propõe algo bastante moderado, focando em regular os relacionamentos entre agentes públicos e a representação de interesses privados, trazendo ética, transparência e segurança jurídica para todos os grupos de interesse. Claro que ajustes poderão ser necessários e isso é natural no processo de elaboração normativa.


Gerou certo desconforto, por exemplo, o fato de os agentes de relações institucionais e governamentais públicos não estarem listados entre aqueles que deverão se submeter aos comandos da lei. Esses atores são bastante significativos no processo de formulação de políticas públicas e possuem alta circulação no Congresso. Com eles de fora, deixaremos de coletar muita informação e de ter um panorama mais realista do debate público no país.


Outro ponto de atenção é a questão da nova nomenclatura utilizada para se referir aos profissionais de RIG: Representação Privada de Interesses. Em um primeiro olhar, parece algo de menor relevância, mas existe uma questão de identificação e traz uma mensagem que faz parecer que o interesse privado está longe do interesse público ou que é divergente, quando, na verdade, uma boa política pública é aquela que equilibra os interesses públicos e privados.


Ademais, é relevante citar a relação às exigências para o exercício da atividade e eventuais punições. Até então, todas as discussões previam a criminalização de condutas em desacordo com os agentes de RIG. O projeto, no entanto, acertadamente, escolheu a via administrativa como caminho para repressão de condutas inadequadas. Isso é positivo, pois além de prever um processo de maior agilidade, garante a conformidade com o já vasto arcabouço legal punitivista.


No entanto, merecerá uma análise mais detida se os dispositivos estão suficientemente claros e não abrem espaço para restrição indevida da atividade de RIG. O foco dado, ao que parece, foi garantir a veracidade da informação - o que é fundamental e, inclusive, está nas orientações das Práticas Recomendadas elaboradas pela ABNT - mas, precisamos avaliar se a forma como o texto está escrito não pode engessar demasiadamente as comunicações entre o agente privado e o público.


No mesmo dia de envio ao Congresso do projeto de lei, o governo também publicou um decreto criando o E-Agenda. Essa medida tem uma perspectiva muito positiva, inclusive, pela rapidez que entrará em vigor (outubro de 2022). Essa plataforma tecnológica fará a concentração das informações sobre políticas públicas e relacionamento de forma dinâmica e acessível, ficando eventuais custos e diligências para a manutenção da mesma a cargo dos entes públicos. O E-Agenda vai transformar nossa percepção como agente de RIG, permitindo o cruzamento de informações e a análise científica dos dados. É um passo muito importante para a profissionalização da nossa atividade, promovendo a eficiência de quem faz RIG.


É importante destacar, ainda, que as medidas anunciadas gerarão um estímulo à organização dos grupos de interesse. Se, hoje, algumas instituições e até empresas chegam a ficar alijados do processo por falta de segurança, procedimentos claros e conhecimento da máquina pública, uma vez aprovada a lei, a regra será clara e aplicável para todos. Ganham o poder público, o setor privado e, acima de tudo, a sociedade como um todo.


No final das contas, a regulamentação também vai separar quem trabalha com seriedade de quem ainda tenta se esgueirar pelas sombras em busca de vantagem indevida, deturpando políticas públicas e cometendo crime. E essa é uma das principais lutas da Abrig, que desde a sua fundação, em 2007, traz no seu Código de Conduta a obrigatoriedade do profissional de RIG expor aos agentes públicos quem ele representa e qual a finalidade da sua participação no processo decisório.


Depois de tanto tempo de espera, esse momento é simbólico e representa uma virada de chave. Só de acompanhar os noticiários, já é possível observar a diferença. Nós, profissionais de RIG, nunca fomos tão bem referenciados e a importância de se legitimar a atuação de representantes da sociedade no debate de políticas públicas nunca foi tão apoiada. Agora, além de celebrar, é hora, mais do que nunca, de praticarmos para que as propostas de regulamentação sejam aprovadas no Congresso no prazo mais rápido possível.


Carolina Venuto é presidente da Abrig.


*Os conteúdos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores. As opiniões neles emitidas não exprimem, necessariamente, o ponto de vista da Abrig.  


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