A pandemia afetou a forma de atuação da grande maioria das empresas brasileiras, acelerando os investimentos em tecnologia e inovação. Em uma entrevista exclusiva para a Abrig, o presidente do Sebrae Nacional, Carlos Melles, falou sobre como pequenos negócios podem crescer utilizando planejamento, preparo e inovação, além da necessidade de programas e políticas públicas que incentivem o empreendedorismo feminino.
Melles também destacou como os pequenos negócios se reinventaram na pandemia com as vendas on-line e como essa iniciativa veio para ficar. “A tendência é que a população continue consumindo muito a distância, e as empresas vão ter de se reinventar para prestar seu serviço em domicílio. Nesse aspecto, os empresários precisarão pensar em uma estrutura de custos diferente, em um novo modelo de negócio”, destacou. Confira a seguir os principais pontos da entrevista.
ABRIG: Ao longo de 2020, muitos tiveram sua vida transformada pela pandemia da Covid-19. Por isso, cresceu o empreendedorismo motivado por necessidade. A longo prazo, qual a perspectiva para esses novos micros e pequenos negócios?
De acordo com a pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM) 2020, realizada no Brasil pelo Sebrae, em parceria com o Instituto Brasileiro de Qualidade e Produtividade (IBPQ), a taxa de empreendedorismo por necessidade saltou de 37,5% para 50,4%, o mesmo nível de 18 anos atrás. Com a crise, 82% dos novos empreendedores alegaram que foram motivados pela carência de emprego.
Mas, não é porque uma pessoa começou a empreender por necessidade que ela não poderá ter sucesso na empresa. Muitas vezes, uma necessidade pode se transformar em uma grande oportunidade, desde que o empreendedor faça um bom planejamento e fique atento ao que o mercado deseja. Com preparo e inovação, é possível que esses pequenos negócios cresçam no futuro e sobrevivam. O Brasil é um país empreendedor e temos muito espaço para crescer.
Para ajudar ainda mais os empreendedores, o Sebrae tem diversas soluções que podem auxiliá-los nessa fase. Procure o Sebrae, ligue no nosso 0800 e converse sobre sua ideia com os consultores. Para dar certo, é necessário um preparo mínimo. O Sebrae ainda oferece mais de 140 capacitações gratuitas e online para ajudar.
ABRIG: No contexto brasileiro, a inovação das empresas já estava acontecendo antes da pandemia? Qual foi seu impacto?
Não há dúvida de que a pandemia acelerou um processo de mudança que já era percebido em vários setores. Os casos do trabalho em home office e do comércio digital são apenas dois exemplos disso. O que já era uma tendência muito forte no mercado, de repente – por conta da necessidade de isolamento social – tornou-se um imperativo.
A pesquisa de Impacto da Pandemia do Coronavírus nas Micro e Pequenas Empresas, que fazemos em parceria com a FGV, desde março do ano passado, detectou um crescimento de 21 pontos percentuais no número de pequenos negócios, que incluíram o comércio eletrônico nas suas vendas. Antes da crise, 49% das empresas de pequeno porte usavam as vendas online para atender sua clientela. Agora, somando aqueles que já usavam e os que passaram a usar, eles correspondem a 70%.
O cliente também mudou e nós não voltaremos ao estágio que estávamos antes da crise. O consumidor quer continuar usufruindo de produtos e serviços, se deslocando menos, com menos desgaste no processo da compra do produto ou serviço. A tendência é que a população continue consumindo muito a distância, e as empresas vão ter de se reinventar para prestar seu serviço em domicílio. Nesse aspecto, os empresários precisarão pensar em uma estrutura de custos diferente, em um novo modelo de negócio.
ABRIG: As mulheres foram as mais impactadas pela crise: só o número de empreendedoras já estabelecidas diminuiu 62% de 2019 para 2020 — queda muito maior do que a verificada entre os homens (-35%). Como instaurar a diversidade no mercado? Ela serve de ferramenta para alavancar os negócios?
Em linhas gerais, a pandemia afetou enormemente o Brasil e impactou muito o grupo mais vulnerável dos empreendedores, como, por exemplo, as empreendedoras. Isso fez com que houvesse uma reversão das conquistas adquiridas ao longo dos últimos anos. Na prática, o perfil qualitativo das mulheres à frente de um negócio mudou em 2020: entraram mulheres mais inexperientes e saíram as com mais tempo de empreendedorismo. Apesar do aumento da participação delas no empreendedorismo inicial, saíram mais mulheres do que entraram, porque muitas se viram obrigadas a cuidar da família - o que diminuiu a participação feminina no mundo dos negócios.
Em 2020, as mulheres corresponderam a aproximadamente 46% dos empreendedores iniciais, número um pouco superior ao registrado em 2006, quando a taxa era de 43,8% e mais de quatro pontos percentuais inferior ao registrado em 2019, quando as empreendedoras representavam metade dos empreendedores iniciais. Esse grande volume de novas empreendedoras demonstra a importância de projetos como o Sebrae Delas, que tem o objetivo de aumentar a probabilidade de sucesso de ideias e negócios liderados por mulheres. Por isso. é tão necessário que sejam desenvolvidos programas e políticas públicas que incentivem o empreendedorismo feminino.
ABRIG: De acordo com o Sebrae (Pesquisa Global Entrepreneurship Monitor), o número de brasileiros com um negócio estabelecido há pelo menos 3,5 anos desabou de 22,3 milhões em 2019 para 12 milhões em 2020. Qual o futuro do empreendedorismo no Brasil?
Apesar da pandemia ter interrompido o crescimento do empreendedorismo no Brasil, acredito que ele voltará a crescer. De acordo com essa mesma GEM, empreender passou a ser o segundo maior sonho do brasileiro e isso nos trará resultados lá na frente. Nossa expectativa é que, no momento em que a população estiver vacinada, muitos empreendedores que fecharam as portas por conta da crise, resolvam abrir novas empresas, assim como devem surgir novos empresários, movidos pelas oportunidades que serão criadas nesse novo momento da sociedade e da economia.
Neste momento de retomada, momento em que olhamos para o futuro do empreendedorismo, é importante que as empresas se aproximem dos clientes, diversifiquem seu portfólio, adotem lições de boas práticas e mecanismos que assegurem ao cliente segurança sanitária. Para voltar a faturar, elas terão que adotar, com rigor, os protocolos de segurança e aderir às novas tecnologias com o intuito de garantir aos clientes mais confiança no empreendimento e comodidade.
Enfatizamos, ainda, que o Sebrae prevê uma série de ações voltadas a apoiar os pequenos negócios na abertura de novos mercados (digitalização das empresas), melhorar as finanças do negócio e desenvolver ações junto ao Congresso e ao governo para melhoria das políticas públicas.