O responsável pelo engajamento empresarial na América Latina do Fórum Econômico Mundial, mostra porque não existe “marcha a ré” no processo de governança global e demonstra como deve proceder o envolvimento estratégico entre empresas e políticas públicas para a década que inicia.
ABRIG: Como opera o Fórum Econômico Mundial para conduzir ao “Great Reset”?
SILVIO DULINSKY: O Fórum é hoje uma grande plataforma de centenas de iniciativas, que ocorrem em paralelo, para a colaboração público privada. São 450 iniciativas, com as quais contribuímos de maneira significativa, que estão alinhadas em 18 plataformas específicas: o futuro da energia, os mercados financeiros, o futuro da informação, mídia e entretenimento, o futuro do trabalho e educação, igualdade de gênero, inclusão e outras, procurando conceitualizar esses desafios - mobilizar talentos, recursos, pessoas, organizações e trabalhar sobre o que for necessário fazer a respeito. O que o Fórum faz é trazer esses líderes à mesa, para que levem adiante essas iniciativas durante o ano todo. As pessoas conhecem principalmente o encontro anual de Davos, mas o trabalho ocorre durante todo o ano.
ABRIG: Como o Fórum levou seu trabalho adiante num ano de pandemia?
SILVIO DULINSKY: A pandemia tería sido um “Black Swan”, ou Cisne Negro, se tivesse sido inesperado, mas, na verdade, desde 2013 já temos relatórios prevendo que o mundo estava suscetível a uma pandemia global. Este é um momento para reconfigurar as prioridades da sociedade moderna, em função do equilíbrio entre as necessidades ambientais, sociais e econômicas, o “triple bottom line”. Destes, o mais marcante, é a mudança climática, porque exige uma mudança no formato dos negócios, algo que não se faz apertando um botão. É um trabalho de vários anos, onde se tem de trabalhar com toda a cadeia de valores. Para tanto, envolvemos os líderes de empresas e de governos para a construção de políticas públicas e assim, colocar em prática incentivos econômicos, para que as empresas façam os investimentos necessários às transformações nos modelos de negócios.
ABRIG: Como fazer essa transformação cultural?
SILVIO DULINSKY: Temos que conscientizar principalmente os jovens, e a sociedade em geral, a terem um papel ativo através do exercício dos seus direitos democráticos. Não é uma solução mágica. É um trabalho de formiguinha. Quando a gente fala de “Great Reset” falamos de repensar o nosso modelo econômico, nosso modelo social e nosso modelo de sociedade democrática liberal ocidental. Globalização nada mais é que a liberdade dos agentes econômicos em trabalhar além dos limites das fronteiras nacionais, numa interligação cada vez maior entre os atores globais. Não tem marcha a ré nisso, é inevitável.
Os fluxos financeiros vão continuar a seguir o mesmo padrão dos últimos anos, buscando investir nas economias que oferecem oportunidades e segurança. Esses capitais significam investimentos, o que conduz ao desenvolvimento de infra-estruturas produtivas , geração de emprego e crescimento econômico. O “Great Reset” implica reformular todos os âmbitos da sociedade, enquanto poder econômico, social e também no nível dos indivíduos… a maneira como nós nos relacionamos.
ABRIG: Nesse sentido, as alterações comportamentais aceleradas pela pandemia, colaboraram com o novo processo cultural?
SILVIO DULINSKY: Há 6 meses atrás, era muito difícil reunir Ministros e Presidentes em “webinars”, em reuniões virtuais. Hoje, isso se tornou algo natural. A maneira como as pessoas estão interagindo mudou muito nestes 6 meses. É como se em poucos meses tivéssemos feito um “fast-forward” de 10 anos com relação à adoção de novos comportamentos digitais e da maneira de interagir socialmente.
ABRIG: Qual o papel do profissional de RIG em convencer os atores da sociedade a seguirem as “guidelines” do Fórum, nesse novo modelo de governança globalizada?
SILVIO DULINSKY: No Fórum, trabalhamos, com muita frequência, com profissionais de RIG de empresas internacionais. Estas, cada vez mais, se esforçam na transformação do nosso modelo capitalista de foco no acionista, para o foco em todas as partes interessadas, foco nos “stakeholders”. Na sociedade atual somente cumprir com a lei já não é suficiente, as empresas têm que resolver problemas da sociedade. Elas precisam ter um engajamento com todas as partes interessadas, que não seja apenas de escutá-los, mas envolvê-los de maneira construtiva num diálogo que conduza a ações para resolver problemas reais.
Neste processo, os profissionais de RIG são muito importantes, porque eles traduzem essa demanda da sociedade, enquanto a sua relevância estratégica para as empresas, criando essas pontes de diálogo com os agentes públicos. Esses profissionais tem a enorme responsabilidade de entender esse processo de transformação da sociedade e as novas expectativas em relação às empresas, para que que as elas possam se transformar, atender estas expectativas e ao mesmo tempo desenvolver novas oportunidades de negócio. Por exemplo, um caso prático se refere às consequências para os negócios de combater a mudança climática. Para alcançar um corte nas emissões de CO2 de 50%, em 10 anos, temos que começar agora. As decisões devem ser tomadas já.
O profissional de RIG deve trabalhar com o pessoal da linha para identificar os riscos e oportunidades e conseguir que estejam comprometidos a tomar ações. comprometido com isso. Não basta ele, ou o presidente, ou o pessoal do RH da empresa estarem engajados.
Silvio Dulinsky é responsável pelo setor privado na América Latina e pela área de inteligência global em governança corporativa no Fórum Econômico Mundial.