Os desafios do mercado legal

ABRIG: Como fortalecer o mercado legal brasileiro?


DELCIO SANDI: Um dos principais ofensores ao fortalecimento do mercado legal e da economia brasileira é a ilegalidade. Produtos ilegais roubam empregos, renda e reduzem drasticamente a arrecadação dos governos. Além disso, boa parte do lucro da ilegalidade é destinado ao crime organizado. Sendo assim, o fortalecimento do mercado legal passa, necessariamente, pelo enfrentamento ao contrabando e outras formas de ilegalidade, oferecendo condições de competitividade à indústria legal, o que passa por ações para coibirem a oferta e a demanda. Recentemente, como reflexo do contexto trazido pela pandemia, houve retomada de parte do mercado legal de cigarros devido à alta no preço do dólar, redução dos canais informais, fechamento parcial das fronteiras com o Paraguai e aumento das apreensões feitas pelos órgãos de repressão. Este exemplo mostra que, sob condições mais adequadas, e que não estão somente relacionadas à repressão, a indústria legal é capaz de recuperar consumidores.


ABRIG: Quais os caminhos para tornar o combate à pirataria, falsificação e contrabando no país mais efetivo?


DELCIO SANDI: Esses são problemas multifatoriais, portanto, exigem soluções em diferentes frentes. A repressão somente não é suficiente, mas, é extremamente necessária, principalmente com mais recursos e trabalho integrado. Um exemplo com bons resultados é o Programa V.I.G.I.A, que integra diferentes órgãos de repressão e tem contribuído para atacar as rotas do contrabando.


Outra via fundamental é uma readequação da estrutura tributária, que traga competitividade à indústria nacional, sem a necessidade de redução de carga tributária. De qualquer modo, não há mais espaço para aumento de carga tributária, o que no caso de cigarros, tem demonstrado não ser efetivo do ponto de vista arrecadatório e, tem transferido volumes do mercado formal para o informal, contribuindo para os lucros do crime organizado e reduzindo empregos.


ABRIG: Um dos desafios do país é a proteção à propriedade intelectual e industrial, assim como a ética concorrencial. Como melhorar o ambiente de negócios para proteger esses dois pontos?


DELCIO SANDI: A falsificação de produtos traz prejuízos não só às empresas, que enfrentam mais diretamente a concorrência desleal, mas, também, ao consumidor, que compra produto sem qualidade, e ao governo, que perde em arrecadação. Portanto, melhorar o ambiente de negócios envolve, primeiramente, ações que devolvam a competitividade às empresas legalmente estabelecidas. A concorrência com o mercado ilegal é antiética por essência.


ABRIG: Quais as experiências internacionais de sucesso sobre Mercado Legal que você poderia citar para serem aplicadas no Brasil?


DELCIO SANDI: Um exemplo importante vem do Canadá. Em Quebec, foi adotada a capacitação de forças policiais, voltada a fortalecer o cumprimento da lei federal e para se fazer valer de maneira mais efetiva a lei das províncias, com destinação de mais recursos voltados à repressão do contrabando de cigarros. Esta abordagem de fiscalização aumentada e coordenada teve sucesso considerável para reprimir o mercado ilegal e ampliar o legal, com retorno comprovado. O México, por exemplo, evitou o aumento de carga tributária por um bom tempo, e junto a repressão conseguiu reduzir o mercado ilegal.


ABRIG: Como a reforma tributária poderia ajudar na diminuição da pirataria, falsificação e contrabando no Brasil?


DELCIO SANDI: Uma discussão tributária é fundamental para resolver gargalos que barram o crescimento econômico, além de devolver à indústria legal a competitividade frente à ilegalidade. No setor de tabaco, a alta carga tributária vem favorecendo o crescimento do mercado ilegal, que domina mais da metade de todos dos cigarros vendidos no país. A situação não só afeta a demanda pelo tabaco, mas a indústria e o varejo legais, prejudicando toda a cadeia, além da sociedade e o governo, que perde arrecadação. Uma reforma tributária efetiva deve levar em consideração a experiência que o país tem tido nos últimos anos: aumentar demasiadamente a carga tributária e tornar o sistema tributário mais regressivo, reduz a arrecadação ao longo do tempo e somente transfere volumes legais para criminosos.



Delcio Sandi é diretor de Relações Externas da BAT Brasil (ex-Souza Cruz). É presidente do Conselho de Administração do ETCO (Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial) e Presidente do Conselho de competitividade, ambiente de negócios e segurança, da Associação Comercial do Rio de Janeiro.


*Os conteúdos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores. As opiniões neles emitidas não exprimem, necessariamente, o ponto de vista da Abrig.  


compartilhe

navegação de notícias

notícias recentes

Tags

melhores escolhas dos leitores

categorias

notícias mais populares

siga-nos