Profissionalização da atividade de RIG no Brasil: breve histórico e avanços

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 termo lobby é mal compreendido. Aparece comumente associado à influência desmedida de interesse poderosos, que capturam os órgãos de Estado, as políticas públicas e os políticos em geral. Pior ainda, ele está associado a práticas ilícitas. Desde 2013, a American League of Lobbyists (ALL) dos Estados Unidos mudou de nome para Association of Government Relations Professional (AGRP). Essa mudança sugere, prima facie, que o objetivo foi evitar o termo, por ter uma carga pejorativa. Mas se isso for verdade, é verdade também que existem outras boas razões para a adoção dessa estratégia.


A AGRP justifica a mudança argumentando que a atividade evoluiu e os seus membros fazem muito mais do que percorrer os corredores do Congresso e tentar moldar a legislação. A ideia, portanto, seria melhor refletir a gama de profissões de seus membros. Nesse sentido, o slogan da AGRP é auto explicativo: “The Voice of the Lobbying, Public Policy and Advocacy Professions”, deixando claro que já não são apenas lobistas. Ou, em interpretação nossa, que o lobbying é apenas uma pequena parte de uma atividade maior e muito mais complexa.


Independente do que motivou a mudança de nome da ALL, é fato que a atividade de RIG mudou significativamente ao longo dos anos. Ela é cada vez mais formada por profissionais de diferentes áreas, lança mão da expertise de múltiplas áreas de conhecimento, e se tornou altamente interdisciplinar. Por outro lado, a crescente complexidade das instituições, de Estado e de Mercado, tem exigido tratamento cada vez mais diversificado por parte de quem defende interesses, e pode e deve contribuir. Acreditamos que esses fatores são responsáveis pelo que estamos chamando aqui de profissionalização da atividade de RIG (Relações Institucionais e Governamentais).


No Brasil, a história foi um pouco diferente. A Abrig, fundada em 2007, já foi criada adotando nomenclatura correlata e com o objetivo de promover a transparência e a profissionalização das atividades de representação de interesse nos processos de tomada de decisão de políticas públicas. Desde sua criação, a Abrig tem desempenhado um papel importante na promoção de boas práticas e na definição de padrões éticos para os profissionais de RIG no país. Nos últimos anos, muitas iniciativas podem ser registradas, e compuseram o quadro de profissionalização que hoje se assevera. Aqui selecionamos algumas que nos parecem demonstrações inequívocas da profissionalização da atividade.


A autorregulamentação

O Código de Ética e Conduta instituído pela Abrig representa um avanço para a profissionalização da atividade de RIG. Criado no ano de 2021, o conjunto de normas dispostas no documento reflete o compromisso da entidade com o referenciamento dos pressupostos éticos e democráticos que devem nortear a atuação profissional de seus conselheiros, dirigentes, associados e demais colaboradores. Em que pese a não congregação da totalidade do universo de profissionais e organizações RIG do Brasil, as normas e instruções estabelecidas pelo Código da Associação representam um importante modelo de autorregulação do setor e de suas práticas profissionais. 


O registro no Cadastro Brasileiro de Ocupações - CBO

O Cadastro Brasileiro de Ocupações reconhece, nomeia e codifica as profissões e atividades, assim como descreve as suas características no mercado de trabalho brasileiro. Em 2018, os profissionais de RIG entraram para a CBO, inaugurando uma nova possibilidade de ver sua atividade registrada como tal. Importante passo para o seu reconhecimento e legitimidade.


As normas da ABNT

Na ausência de uma regulação específica para as atividades de Relações Institucionais e Governamentais no país, as ações da Abrig para definir códigos de ética e definição de normas de conduta profissional vêm promovendo a autorregulação do setor. Trata-se da Prática Recomendada para Relações Institucionais e Governamentais (ABNT PR 1001:2020). Com base na experiência de organizações internacionais, como Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Transparência Internacional, União Europeia, dentre outros. A PR 1001 busca “estabelecer diretrizes e orientações de conduta para os profissionais de RIG em suas relações com os agentes públicos, com os seus clientes e com o público em geral, desempenhando um papel importante na promoção da integridade, deixando evidente a conduta esperada daqueles que atuam em RIG” (ABNT, 2020). Este documento representa mais um esforço de autorregulamentação e é mais uma evidência da profissionalização das atividades de RIG.


Participação no Conselho de Transparência da CGU

Recentemente, em maio de 2023, registra-se mais um passo importante, a participação da entidade no Conselho de Transparência, Integridade e Combate à Corrupção (CTICC), da Controladoria-Geral da União. Juntamente com outras entidades da sociedade civil, o reconhecimento da Abrig pelo órgão de controle do Governo Federal é mais um indicador de profissionalização. Esse, até agora, em nosso ponto de vista, o mais relevante para consolidação da atividade e do reconhecimento da sua legitimidade e compromisso com os princípios éticos.


O apoio à regulamentação da atividade

Ao longo dos últimos anos, a regulamentação da atividade de RIG ocupou posição de destaque na agenda do Congresso Nacional. A iniciativa mais recente é o PL 2914/2022, aprovado na Câmara dos Deputados como PL 1202/2007, que “dispõe sobre a representação de interesse realizada por pessoas naturais ou jurídicas perante agentes públicos com o fim de efetivar as garantias constitucionais, a transparência e o acesso a informações”. Em meio a um cenário de divergências e expectativas em torno da proposta, os profissionais não se furtaram ao debate, participando ativamente, sugerindo melhorias e sempre defendendo sua aprovação. A matéria foi objeto de um intenso debate na Câmara e evidenciou a importância da profissionalização da atividade de RIG para as diversas organizações sociais que exercem representação privada de interesses no País.


Se alguns setores econômicos se queixam por excesso de regulação por parte do Estado, todas essas evidências mostram que os profissionais de RIG não apenas vêm defendendo a aprovação de uma lei que regule seu segmento, como vêm promovendo esforços para a autorregulação das suas atividades. A atuação desses profissionais contribui para uma relação mais transparente e ética entre os setores público e privado, ajudando a fortalecer a democracia e a participação cidadã nos processos de formulação e tomada de decisão de políticas públicas.


Escrito por:

Manoel Leonardo Santos

Professor do Departamento de Ciência Política e coordenador do Centro de Estudos Legislativos da UFMG.

Karoline Rodrigues de Moraes

Doutoranda em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Caio Cardoso de Moraes

Doutorando em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).



*Os conteúdos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores. As opiniões neles emitidas não exprimem, necessariamente, o ponto de vista da Abrig.  

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