RIG na Agenda Federativa em 2023

O mês de janeiro foi marcado pelas Relações Institucionais e Governamentais de Estados e Municípios. Diferentes espaços no cenário nacional deram relevância à temática, tais como: a reunião do Fórum dos Governadores, o lançamento do Conselho da Federação pelo ministro Padilha, a confirmação do presidente da República nos momentos importantes de diálogo com os municípios, o Simpósio Regulamentação do Lobby no Brasil promovido pela Fundação Republicana Brasileira (FRB) e com participação da Abrig, com destaque ao painel “Lobby nos estados e nos municípios”.

Inicio esta reflexão sobre a temática com a conquista do Conselho da Federação, que será composto pelo presidente da República e ministros, um representante do Fórum dos Governadores e cinco representantes dos consórcios regionais dos estados, seis representantes das três entidades nacionais municipalistas. Assim como aconteceu no Fórum dos Governadores, os presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados poderão ser convidados a discutir a pauta legislativa prioritária. Instância essa que institucionaliza a arena de relacionamento intergovernamental, mudando o locus de atuação de uma relação direta com o Congresso Nacional e pulverizada em diferentes órgãos federais para a retomada de uma centralização das demandas no Palácio do Planalto, como a do início do Comitê de Articulação Federativa (CAF). A grande novidade é a presença dos governadores e a clareza de que essa arena apenas vigorará na presença do primeiro escalão do governo.


O encontro com os governadores e, na ocasião, a confirmação da presença do presidente Lula na 84ª Reunião Geral da FNP (13 e 14 de março), e na Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios (27 a 30 de março) demonstram que o executivo federal será capaz, ainda, de valorizar e absorver pautas específicas dos estados, das grandes cidades e das entidades municipalistas. A tão discutida institucionalização do Fórum dos Governadores deverá ganhar velocidade frente à regulamentação da Associação de Representação de Municípios na Lei nº 14.341 de maio de 2022. Os dados sobre a evolução da receita disponível de estados e municípios demonstram a vantagem obtida pelo poder local na corrida por recursos do bolo tributário.

Mais que um CNPJ, a institucionalização do Fórum dos Governadores terá como desafio unificar diferenças regionais e canalizar a agenda mínima dentro dos mecanismos de coordenação da federação brasileira. A sobreposição de mesas temáticas às entidades nacionais, como CONSED e CONSEFAZ, certamente será tema de orquestração. De acordo com art. 46 da Constituição Federal de 1988, cabe ao Senado Federal representar os estados e o Distrito Federal. Esse deverá ganhar mais atenção como a casa iniciadora da tramitação legislativa. As bancadas estaduais, historicamente pouco coesas, deverão ser articuladas nessa lógica de casa revisora. Estudos deverão ser capazes de influenciar a opinião pública e ganhar pauta na imprensa nacional. A recuperação de perdas do ICMS e a alteração dos critérios da Capacidade de Pagamento (Capag) ganharão atenção junto à discussão da reforma tributária. A equipe do Fórum dos Governadores também terá papel fundamental em Brasília de identificar recursos e destravar a burocracia das obras de infraestruturas em cada estado. Temas da nova economia como descarbonização e transição energética na reindustrialização deverão ser apresentados pelo governo federal para convergência de esforços. A representação dos governos estaduais em fóruns internacionais, como a candidatura do Brasil na COP30, também poderá ser favorecida nessa institucionalização.


Com o prazo de dois anos para as associações de munícipios se adaptarem ao disposto na Lei nº 14.341 de 2022, espera-se um crescimento nas postulações em juízo, em ações coletivas na qualidade de parte, terceiro interessado ou amicus curiae frente ao poder judiciário e em processos administrativos nos Tribunais de Contas e órgãos do Ministério Público. Para além da luta nos royalties de Petróleo e do ISS no Supremo Tribunal Federal, o Conselho Político da Confederação Nacional de Municípios (reunido em janeiro de 2023) indicou como pauta prioritária o impacto no Fundo de Participação dos Municípios pela não finalização do Censo Demográfico, a defasagem dos programas federais e o financiamento federal dos pisos salariais nas carreiras públicas. A CNM deverá seguir a estratégia de grassroots (lobby indireto), com sensibilização da opinião pública por meio de pesquisas e mobilização permanente das lideranças locais, em contato (por WhatsApp) com seus parlamentares e autoridades próximas do executivo federal.


O Anuário Multicidades[1], lançado ano passado pela Frente Nacional de Prefeitos, chama atenção para a despesa na área social frente à Emenda Constitucional nº 95 de 2016, conhecida como Teto dos Gastos. Na educação, a desigualdade entre os municípios no dispêndio por aluno reabre a discussão sobre o futuro do FUNDEB. Na saúde, o “desfinanciamento do SUS” servirá como janela de oportunidade para reintroduzir o pleito do Mais Médicos. O repasse da União aos municípios pelo Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) em 2021 foi o menor valor auferido nos últimos 15 anos e evidenciará a luta contra a maior alta no número de pessoas pobres e extremamente pobres desde 2012. Saneamento, mobilidade urbana e déficit habitacional também ganharão força com a nova estrutura ministerial. A FNP fortalecerá os canais de diálogo direto com o governo federal, tendo se reunido desde o governo de transição com as principais pastas do executivo federal.


A Associação Brasileira de Municípios se apresentará com a bandeira da sustentabilidade e da inclusão, valorizando iniciativas direcionadas aos ODS, com especial atenção à articulação internacional e à implementação de projetos. Destaque para o Pacto Global de Prefeitos pelo Clima e a Energia, uma aliança de governos locais comprometidas com a luta as mudanças climáticas.


Lideranças estaduais e municipalistas devem debater em 2023 o Projeto de Lei 1202/2007, recentemente aprovado na Câmara dos Deputados e encaminhado no fim do ano para o Senado Federal. A proposta visa ampliar a transparência e a integridade no processo de defesa de interesse, sendo uma recomendação consolidada da OCDE para os países que visam integrar o grupo, devendo ser uma das questões a serem demandas no processo de adesão do Brasil à organização internacional. O projeto abarca como representante de interesse as entidades de classe, instituições nacionais e estaduais, assim como a atividade exercida por agente político perante agente público de órgão ou entidade da administração pública direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Abrange, ainda, pessoa natural que realiza atividade de interesse próprio, terceiro ou coletivo difuso, com remuneração ou não. Como deveres do representante de interesse, temos a identificação prévia das interações com agente público, a descrição do assunto e a preservação do direito de expressão daqueles de quem divirja. Na lista taxativa das pessoas expostas politicamente, temos governadores, secretários de estados, prefeitos, vereadores e secretários municipais.


Mais que a interação no âmbito federal, é importante analisar a dinâmica de representação de interesses no âmbito local. Trata-se de expressões de cidadãos e lideranças comunitárias no espaço público que não constam de solicitações formais ou registro de hospitalidades. Quanto à oferta de bens e serviços, é permitido brindes, livros e até mesmo transporte, alimentação e hospedagem em eventos, mas é preciso dar transparência a esses benefícios para garantir que as circunstâncias sejam apropriadas aos interesses do órgão a que pertence o agente público. Temos que discutir se a regulamentação da lei nos municípios requer um prazo maior que no âmbito federal e, até mesmo, acolher as experiências internacionais já implementadas, como o caso do Chile e do México. O Senado Federal certamente será um espaço sensível para adequações e avanços necessários para o amadurecimento da governança pública brasileira.


[1] https://multimidia.fnp.org.br/biblioteca/publicacoes/item/1009-multicidades-ano-18-2023


Por: Gustavo Cezário, presidente do Conselho Fiscal e diretor da Abrig, assessor institucional Sebrae Nacional, professor de Federalismo e Relações Institucionais, mestrado em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília.


*Os conteúdos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores. As opiniões neles emitidas não exprimem, necessariamente, o ponto de vista da Abrig.  

compartilhe

navegação de notícias

notícias recentes

Tags

melhores escolhas dos leitores

categorias

notícias mais populares

siga-nos